O Farol Reportagem mostrou,
em Dezembro 2016, que a remuneração de servidores de
diversos órgãos em Santa Catarina supera o teto estabelecido pela Constituição
Federal.
A soma dos valores além do teto foi de R$ 110 milhões, em
apenas um mês, agosto de 2015.
Se existe um teto estabelecido pela
Constituição, como e por que isso acontece? É legal? É moral?
Os estudantes de administração pública da
Udesc Esag realizaram uma pesquisa sobre o tema no primeiro semestre de 2017,
tentando compreender e responder a questionamentos sobre o teto de remuneração de servidores. A pesquisa foi
realizada com base na reportagem e dados publicados pelo Farol, relativos a auditoria do Tribunal de Contas
do Estado de Santa Catarina (TCE-SC) realizada em agosto de 2015, bem como informações dos portais de transparência,
reportagens, legislação e consulta a especialistas.
A partir de hoje, 29 de Junho, publicaremos uma série de textos sobre o tema neste Blog do Grupo de Pesquisa Politeia, elaborados de forma coletiva por estudantes e professora da disciplina Sistemas de Accountability.
A partir de hoje, 29 de Junho, publicaremos uma série de textos sobre o tema neste Blog do Grupo de Pesquisa Politeia, elaborados de forma coletiva por estudantes e professora da disciplina Sistemas de Accountability.
Nesta primeira parte, apresentamos um breve
panorama sobre o tema. Nas próximas semanas, abordaremos alguns dos
pontos que chamam a atenção na análise das planilhas de remuneração de diversos
órgãos, em Santa Catarina, como o subsídio advogado, a venda de férias e
licenças, o abono de permanência, e o acúmulo de vínculos. Daremos destaque a
alguns órgãos, como a Assembleia Legislativa de Santa Catarina, e
às particularidades das empresas de economia mista no que tange à remuneração,
como é o caso da Celesc. Mostraremos, ainda, uma “linha do tempo” com algumas das leis relativas ao tema.
O que diz a Constituição?
A Constituição Federal de 1988 estabelece tetos remuneratórios a serem observados pela Administração Pública:
Art. 37. A
administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos
Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte: (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
[...]
XI - a remuneração e o subsídio dos ocupantes de cargos,
funções e empregos públicos da administração direta, autárquica e fundacional,
dos membros de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal
e dos Municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes
políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória, percebidos
cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra
natureza, não poderão exceder o subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do
Supremo Tribunal Federal, aplicando-se como limite, nos Municípios, o subsídio
do Prefeito, e nos Estados e no Distrito Federal, o subsídio mensal do
Governador no âmbito do Poder Executivo, o subsídio dos Deputados Estaduais e
Distritais no âmbito do Poder Legislativo e o subsídio dos Desembargadores do
Tribunal de Justiça, limitado a noventa inteiros e vinte e cinco centésimos por
cento do subsídio mensal, em espécie, dos Ministros do Supremo Tribunal
Federal, no âmbito do Poder Judiciário, aplicável este limite aos membros do
Ministério Público, aos Procuradores e aos Defensores Públicos; (Redação dada pela
Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003)
O artigo 17 dos Atos das Disposições Transitórias prevê que:
Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os
proventos de aposentadorias que estejam sendo percebidos em desacordo com a
Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se
admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso a
qualquer título.
Desde 1988 até os dias atuais, a legislação pertinente ao tema vem sendo questionada e modificada (em breve publicaremos texto detalhado sobre isso), em meio a muitas controvérsias. Além disso, leis antigas, de antes da Constituição, ainda geram efeitos sobre a remuneração de certas categorias de servidores, muitas vezes em aspectos que, legalmente, não são considerados no limite do teto.
Para o cálculo do teto determinado pela Constituição, consideram-se apenas as verbas de caráter remuneratório, as quais incluem: vencimento básico, subsídio, gratificações e adicionais diversos. Verbas de caráter indenizatório - como auxílio moradia, abono permanência, vale alimentação, auxílio saúde, diárias e vale transporte - não integram o cálculo do teto, por força da própria norma constitucional.
O termo salário
não é apropriado quando se fala em servidores públicos. Embora seja comum falar
em teto salarial, o correto, neste
caso, é teto de remuneração, que corresponde à soma do vencimento com as
vantagens pecuniárias.
Quadro 1: Os principais termos relativos à
remuneração dos servidores públicos
Remuneração: é a
soma do vencimento com as vantagens pecuniárias.
Subsídio: forma de
remuneração usualmente aplicada aos agentes políticos.
Vencimentos: é a
soma do vencimento com as vantagens pecuniárias permanentes.
Vencimento: é a
retribuição pecuniária do cargo efetivo, fixada na tabela da lei.
Vantagens pecuniárias: é a soma dos adicionais com as gratificações e as verbas
indenizatórias.
Adicionais:
adicionam ao patrimônio do servidor. Exemplo: adicional de tempo de serviço.
Gratificação: pecúnia paga em virtude de atividade singular. Exemplo: função
exercida.
Indenização: verba
destinada a ressarcir ou compensar o servidor. Exemplo: Diária.
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Por que
foi estabelecido um teto de remuneração para os servidores públicos?
O propósito dos constituintes, ao estabelecer um
teto de remuneração, era promover certa isonomia entre os servidores públicos,
evitar privilégios de algumas categorias e órgãos e limitar os gastos com o
funcionalismo público. Outras leis também foram estabelecidas nesse sentido,
entre elas a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal, LRF (Lei Complementar nº 101, de 04/05/2000), que estabeleceu limite de gasto dos órgãos públicos
com o pagamento da folha.
Desde 1988, no entanto, interpretações variadas,
controvérsias e negociações têm garantido que certas categorias recebam
remuneração bem maior do que outras. Embora a grande maioria dos servidores
públicos receba muito abaixo do teto, chama a atenção que alguns poucos,
concentrados em determinados órgãos, recebem os chamados supersalários.
Em Santa Catarina, os órgãos com o maior número de servidores que, em agosto de 2015, receberam remuneração além do teto são: Tribunal de Justiça (TJSC), Ministério Público (MPSC), Assembleia Legislativa (Alesc), Tribunal de Contas (TCE-SC), Secretaria da Fazenda (Sefaz), Procuradoria Geral do Estado e Celesc.
Em tempos de crise financeira, como a que estamos vivendo no Brasil desde 2014, inclusive com atraso de pagamento, as diferenças entre categorias de servidores são mais questionadas pela população e pelos próprios servidores.
Temos avançado? Quais as expectativas da população em relação à remuneração dos servidores públicos e seu desempenho?
Em Santa Catarina, os órgãos com o maior número de servidores que, em agosto de 2015, receberam remuneração além do teto são: Tribunal de Justiça (TJSC), Ministério Público (MPSC), Assembleia Legislativa (Alesc), Tribunal de Contas (TCE-SC), Secretaria da Fazenda (Sefaz), Procuradoria Geral do Estado e Celesc.
Em tempos de crise financeira, como a que estamos vivendo no Brasil desde 2014, inclusive com atraso de pagamento, as diferenças entre categorias de servidores são mais questionadas pela população e pelos próprios servidores.
Temos avançado? Quais as expectativas da população em relação à remuneração dos servidores públicos e seu desempenho?
Inúmeras reportagens e pesquisas vem
demonstrando que a sociedade brasileira está mais vigilante em relação ao tema,
exigindo transparência e justificação dos agentes públicos sobre sua remuneração. Tanto pelas diferenças entre eles, como pela qualidade do serviço
que cada órgão entrega à sociedade em troca do investimento público que recebe.
Desde 2011, o
Congresso em Foco, parceiro do Farol, é um dos canais que vem dando destaque ao
tema, publicando uma série de reportagens e notícias sobre remuneração de
servidores tema,
provocando reações de sindicatos e certos segmentos da administração pública.
A partir de 2012, com a entrada em vigor a Lei
de Acesso à Informação, LAI (Lei nr. 12.527),
a remuneração de servidores públicos passou a ser publicada nos portais de
transparência de todos os órgãos públicos. Alguns órgãos tentaram escapar dessa
previsão de Lei de Acesso à Informação, mas o entendimento do Judiciário tem
sido o de fazer cumprir e divulgar todos os rendimentos, inclusive os chamados
“penduricalhos” recebidos por cada servidor. A remuneração de servidores é um
dos assuntos mais pesquisados pelos cidadãos nos portais.
Apesar dos avanços no sentido de estabelecer um
teto, de buscar limitar os gastos com servidores públicos e de alcançar mais
transparência na administração pública, ainda existem situações
que geram dúvidas quanto à legalidade e à moralidade dos vencimentos, vantagens
e gratificações de alguns servidores.
Ecoando expectativas e pressões da sociedade, em
dezembro de 2016, o
Senado aprovou e enviou para a Câmara o projeto de lei 6726/2016, que
pretende acabar com o “extra teto” de valores
recebidos pelos servidores. O projeto lista 39 tipos de pagamentos que passam a
entrar na conta dos valores que são abatidos do total da remuneração mensal do
servidor, quando esta ultrapassa o teto constitucional. O presidente do Senado
na época, Renan Calheiros (PMDB-AL), chamou de “penduricalhos” as gratificações
e auxílios pagos para magistrados, integrantes do Ministério Público e
deputados estaduais, por exemplo. Na Câmara, o
projeto ainda aguarda designação de relator.
As justificativas para os excessos, ou as
vantagens adicionais previstas incluem verbas indenizatórias, gratificações,
ajudas de custo e auxílio-moradia ou auxílio-alimentação, ocorrendo muitas
vezes, na visão do público em geral, abusos e inadequações quanto a essas
vantagens adicionais. São essas vantagens que acabam por extrapolar o teto.
Os avanços em transparência geram oportunidade
para debates mais profundos sobre o desempenho da administração pública, seus
diversos órgãos e servidores. Inclusive os órgãos de controle, que se fortaleceram nas últimas décadas no Brasil, mas nem sempre correspondem às expectativas quanto ao seu desempenho.
As recentes descobertas sobre a corrupção
no país e a crise financeira da administração pública, com muitos governos sem
condições de pagar suas contas, vem aumentando as pressões, também, sobre os órgãos de controle. Os questionamentos do procurador do Ministério Público
junto ao Tribunal de Contas de Santa Catarina, Diogo Roberto Ringenberg, em
manifesto de lançamento do movimento #MudaTC, ecoa as dúvidas de boa parte da
população:
Onde estavam os tribunais de contas enquanto
rombos fiscais bilionários eram construídos? O que faziam enquanto elefantes
brancos eram erguidos para a Copa do Mundo e para as Olimpíadas, eventos que
deixaram como legado apenas dívidas, despesas inúteis e escândalos de
corrupção?
Ainda, os recentes debates no país sobre reforma
trabalhista e reforma da previdência geram discussão sobre vantagens e
benefícios que são concedidos a algumas categorias e não a outras. Até que
ponto são direitos? Onde começam os privilégios? Como e porque foram aprovadas
certos benefícios e gratificações? O que valia antes (e ainda vale para os
servidores mais antigos) e não é mais sustentável do ponto de vista ético,
moral e também legal, para os novos?
Estas e outras questões estarão em pauta por aqui nas próximas semanas. Acompanhe!
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Esta é a primeira de uma série de textos que abordarão o tema
do teto de remuneração dos servidores do estado de Santa Catarina.
Os textos são de autoria
coletiva dos estudantes do 8º semestre do curso de Administração Pública da
Esag-Udesc, no primeiro semestre de 2017.
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